quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Indomável Sonhadora

Beasts of the Southern Wild @ 2012 @ dirigido por Benh Zeitlin



“Indomável Sonhadora” é um dos filmes mais lindos dessa década. Você pode até achar que é exagero, mas vai ser difícil alguém conseguir alcançar a sensibilidade e a inocência que o Benh Zeitlin conseguiu alcançar com essa obra. É como se o Hayao Miyakazi tivesse dirigido um longa-metragem com atores reais, na linha de “A Viagem de Chihiro”, tendo como único diferencial entre suas protagonistas o fato de que Hushpuppy consegue ser ainda mais humana do que a própria Chihiro (que pra mim é um dos personagens mais inocentes da história do cinema). Essa é a jornada de Hushpuppy frente ao universo e tudo presente nele. É a jornada de uma menina de seis anos que precisa amadurecer para enfrentar os perigos do mundo.

O filme é de uma composição de cena impecável, onde toda a sujeira, toda a lama e todas as cores dos diversos objetos espalhados se fundem numa espécie de carnaval; tudo nesse filme é muito belo! A fotografia é impecável e a trilha sonora se encaixa perfeitamente. O filme é quase todo feito com a câmera na mão, o que confere um ar de docu-drama e realidade ao projeto.

E os atores. Eu nem sei se posso chama-los de atores? Cada um deles nos mostra tanta verdade em seus olhares, gestos e palavras que fica difícil acreditar que todos eles jamais tiveram uma única experiência cinematográfica sequer. O Wink de Dwight Henry é o resultado de absoluta entrega ao papel; e até agora me pergunto até onde vai o perfil do próprio ator e o perfil do personagem; ele é enérgico, raivoso, carinhoso, irreverente – um retrato claro de uma vida marcada por dor e esperança diante tamanha miséria. Na Banheira é proibido chorar, e lá eles velam seus mortos com uma bela dose de cachaça. Dwight Henry é absurdamente convincente – um daqueles tipos hostis e ao mesmo tempo dóceis que a gente encontra de vez em quando na vida. O “Daddy” tem seu próprio jeito de amar. Será uma injustiça não vê-lo indicados na categoria coadjuvante nessa temporada de premiações.

E por falar em premiações, chegamos em Quvenzhané Wallis; é inacreditável como uma garota que tinha apenas seis anos na época das gravações consegue nos mostrar tamanha capacidade de atuação. Ela é um pequeno monstrinho, como toda criança; cheia de toques, de pensamentos, de inocência, de vontade, de teimosia. A menina carrega o filme nas costas, com seu olhar firme e seu cabelo emaranhado. Até a narração (coisa que eu não gosto muito) da garota nos atinge. Alguns críticos a chamaram de “pequena força da natureza”, e não há como negar tal fato; Wallis é uma revelação, daquelas de encher os olhos de todos aqueles amantes do cinema. Eu juro que se essa garotinha não for indicada ao Oscar de melhor atriz eu mesmo vou lá tacar uma bomba no meio da Academia – ela botou pra f@#$%! Não vai haver ser humano vivo que não queria saber quem é essa menina depois de ter visto o filme.

A química entre Wallis e Henry é maravilhosa, mesmo com tantos anos de diferença entre os dois e nenhuma experiência prévia na arte de atuar. Confesso que chorei como uma criança no ápice dramático do filme, num momento de total entrega protagonizado por Hushpuppy e seu pai – uma cena linda e inegavelmente digna de prêmios e comentários. Como é que essa menina conseguiu isso? Alguém me explica?

Benh Zeitlin, numa direção segura e memorável (que com certeza alavancará sua carreira monstruosamente), ainda recheia a obra com fantasia e subjetividade em perfeita simbiose. Palmas para ele, para Quvenzhané Wallis, para o Dwight Henry, para todos aqueles da Banheira (que povo lindo e apaixonante!) e para todos que tiveram um dedo na produção desse filme. Um filme como esse nos faz acreditar que o cinema pode sim ser único, mesmo com poucos recursos, diante tamanhas produções e blockbusters. Faz acreditar que há atores por aí com bem mais cacife que muitos no mercado atual.

Que filme lindo! "Indomável Sonhadora" (acabei até perdendo a antipatia por esse título) é inesquecível, de verdade! Assista de coração aberto. Recomendadíssimo!

10/10